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Em 16 de março de 1985, nossos órgãos de inteligência receberam informes de uma concentração da guerrilha no vale do Lar-Mandikul, 30 quilômetros a nordeste de Kabul. O comandante da divisão2 ordenou ao meu comandante de regimento que destruísse essa força de guerrilha. Meu comandante decidiu por realizar um assalto aeromóvel, desembarcando o regimento a uns seis quilômetros da guerrilha, se infiltrar pelo vale, bloquear as saídas e então conduzir uma varredura com parte do regimento, enquanto o restante cobriria o seu movimento. A aviação proveria o apoio de fogo, assim como alguns LMF localizados a quinze quilômetros do vale, com o nosso bronegruppa. Apoio de iluminação seria planejado e, mediante ordem, seria desencadeada por sinalizadores pirotécnicos, granadas iluminativas de artilharia e flares lançados por aviões. Após o cumprimento da missão, o regimento retornaria a pé até o bronegruppa.
Em 19 de março, nós pousamos na Zona de Desembarque e fomos imediatamente localizados pelo inimigo. Ele nos atingiu com um grande volume de fogos e começou rapidamente a retrair suas unidades, sob fogo de nossa artilharia e aviação. Apenas as subunidades avançadas dos nossos 1º e 2º batalhões conseguiram alcançar suas posições de bloqueio e não tiveram poder de combate suficiente para deter o grosso do inimigo. Durante as 48 horas seguintes, nossos grupos de busca encontraram e destruíram “cachês” de armas e munições. As subunidades de cobertura ocuparam o terreno dominante, apoiaram os grupos de busca e repeliram as tentativas do inimigo em abrir caminho pelas posições de bloqueio.
Num vale adjacente, uma situação similar se desenvolveu. O inimigo conseguiu exfiltrar suas subunidades para longe do do assalto do regimento e conduziu uma marcha através do vale. Isto aconteceu porque nós pousamos próximos ao final da coluna inimiga e não conseguimos ocupar as posições de bloqueio designadas pelo regimento. Além disso, mais uma vez o nosso pouso havia sido descoberto e havíamos pousado no local errado. Isso aconteceu porque, ao invés de pousar nos locais designados, preferimos pousar em locais a salvo dos fogos inimigos e que ofereciam melhores condições de pouso (2 x 2 quilômetros). Levou duas horas para reunir as subunidades do meu batalhão e, conseqüentemente, fui incapaz de me deslocar para as posições corretas no tempo previsto. O inimigo escapou.
Comentários da Academia de Frunze:
Devemos ressaltar nessa operação a necessidade de se conduzir um reconhecimento contínuo do inimigo e, dependendo da situação existente, ajustar os planos e, se necessário, trocar sua Zona de Desembarque. Uma companhia deve ter uma Z Dbq, uma batalhão deve ter duas ou três Z Dbq, as quais não devem estar mais que um quilômetro ou um quilômetro e meio afastadas entre si. As Z Dbq devem ser protegidas do fogo inimigo. Não precisamos dizer que é necessário ter uma Z Dbq alternativa também.
O combate no Afeganistão, e em particular nesta operação, demonstrou que exfiltrar uma força de assalto após o cumprimento da missão requer uma atenção maior, pois é nessa fase da operação que as subunidades um número mais significativo de baixas. Durante o retorno para as zonas de reunião a bordo de helicópteros, dê uma atenção especial para se assegurar que o inimigo não posicionou armas ao redor delas. Para manter o inimigo afastado dos pontos de evacuação, use minas lançadas por aeronaves ou LMF. Após evacuar o grosso da tropa, exfiltre os demais postos simultaneamente. Quando estiver deslocando a força de assalto para proteger a zona de evacuação, cubra o movimento com forças de cobertura e aviação, se desloque em formação de pré-combate e com elementos de reconhecimento à frente.
Inicie o plano de carregamento dos helicópteros assim que receber a ordem de exfiltração e refine-o na zona de embarque. Exfiltre os morteiros e suas guarnições primeiro e depois os fuzileiros. O comandante do assalto aeromóvel coordena a exfiltração e embarca na última aeronave, com os últimos elementos do perímetro de segurança. Helicópteros de ataque são mantidos em prontidão completa ou disparam contra os inimigos no seu itinerário. As tropas aerotransportadas, uma vez a bordo dos helicópteros, devem estar prontas para conduzir o fogo de suas armas leves através das aberturas das aeronaves.
A experiência nos mostra que os helicópteros devem permanecer o mínimo de tempo possível no ponto de evacuação e que o pessoal e material concentrados nesse ponto já são um alvo compensador. Os helicópteros podem permanecer no máximo de um minuto a um minuto e meio no solo.
Tropas aeromóveis ou aeroterrestres podem retornar para suas zonas de reunião iniciais, após o cumprimento da missão, embarcados em helicópteros ou em seus veículos blindados. Nesta operação no vale de Lar-Mandikul, o regimento retraiu embarcado no seu bronegruppa após o cumprimento da missão. Isso foi feito à noite. Para navegar à noite, os comandantes utilizaram bússolas e sinalizadores pirotécnicos com pára-quedas. Poderiam ter reconhecido as rotas durante o dia.
Os vários bronegruppas do regimento deslocaram-se por lanços, provendo cobertura para o grosso da tropa. Quando o corpo principal passava por determinado trecho, a força de cobertura daquele trecho se juntava à tropa e outras subunidades se moviam à frente, para as posiçòes de cobertura. Desta maneira, o regimento se mantece um movimento o tempo todo e sofreu um mínimo de baixas nos encontros com o inimigo.
Comentários dos editores norte-americanos
Priorizar a exfiltração dos morteiros ao invés dos fuzileiros é uma decisão do comandante e depende da situação tática, porém haverá situação em que os morteiros serão a última coisa que o comandante irá exfiltrar.
Muitos comandantes preferem formar um “collapsing ring” ininterrupto para evacuar a segurança de uma zona de exfiltração. Este perímetro vai ficando menor a cada vaga exfiltrada. Esta técnica tem melhores chances de prevenir uma infiltração inimiga no perímetro do que estabelecer posto afastado, como este capítulo recomenda.
A exfiltração da força embarcada em seus blindados aparece como um retraimento sob pressão. O deslocamento noturno de uma coluna mecanizada através do vale do Panjshir usando sinalizadores pirotécnicos e bússolas parece ser uma linha de ação que um comandante adote apenas sob pressão.
Comentarios do Vôo Tático.com
Essa técnica do “collapsing ring” (não achei uma tradução decente) parece ser elegantemente simples em seu conceito, mas acredito que seja bastante difícil de se realizar num terreno minimamente movimentado; sempre irá ficar um ângulo morto onde o inimigo pode se esconder ou se infiltrar. A coordenação também não deve ser muito fácil. Uma combinação desta técnica com a russa, deixando alguns postos de obervação, me parece mais exeqüível.
Esse assunto da evacuação de um assalto aeromóvel (uma evacuação de um grande número de militares), requer um planejamento quase tão cuidadoso quanto o do assalto em si. É interessante pois consideramos que o assalto termina com a substituição ou ultrapassagem da tropa que realizou o assalto (até 48 horas após o desembarque). Ou seja, a exfiltração ocorreria sempre a partir de uma posição controlada por forças amigas. No caso de um combate assimétrico ou de contra-insurgência, onde os limites não são claros (ou nem existem), o inimigo pode atuar em qualquer parte, a qualquer hora. Daí a necessidade desse planejamento cuidadoso.
Os russos também sugerem que a tropa embarcada nos helicópteros deverá atirar com suas armas. Isso requer um adestramento maior do que parece, tanto para não causar acidentes como para que o tiro seja realmente efetivo. Não sei se vale a pena.
1 V. G. Chabanenko serviu na República do Afeganistão de dezembro de 1983 até junho de 1985, como comandante de batalhão.
2 103ª Divisão Aerotransportada
Os estadunidenses já faziam dessas no Vietnã…