Lembro-me de quando levava o computador para jogar Counter-Strike ou Warcraft 3 na casa dos amigos. Era um clima agradável, sabe? Se divertir com jogadas toscas acompanhadas de muito refrigerante e pizza rachada com as limitadas mesadas. Espiar pelo canto do olho e ver o que os outros estavam fazendo, rir da estratégia que deu certo e parar um pouco para conversar sobre os mais diversos assuntos. Não tínhamos internet para saborear aquele momento. Não precisávamos dela.
A primeira consequência do mundo online atingiu os video games de uma forma quase natural. Levamos nossas jogatinas para a internet e em um passo mágico estamos interagindo com um universo maravilhoso e quase infinito de possibilidades. Uma espécie de paralelo virtual que nos permite jogar com os amigos há quilômetros de distância.
Maravilhoso, inédito, revolucionário. Mas essa massa digital ainda está limitada por cabos, sinais e servidores. Por meio dela, não podemos dar um tapa no amigo do lado da lan house porque ele jogou uma flashbang “sem querer” na sua frente. Não podemos oferecer mais um pouco de refrigerante enquanto esperamos a tela carregar ou mais um round começar.
Em toda a sua extensão, a internet só falha em não nos colocar fisicamente lado a lado. É um clima estranho, se você já parou para pensar. Você conversa com seus amigos e eles não estão com você. Para alguém de fora, você é alguém falando sozinho na frente do computador. Mas você sabe que seus amigos estão ali, de alguma forma.
Mas o propósito aqui não é realçar os sentimentos humanos de amizade e diversão. Falo de como nós e o mundo dos games estão ficando dependentes da internet. De como colocamos nossos jogos, nossos “savepoints”, nossos checkpoints e nossa interação na esperança de que vamos estar sempre conectados com a internet.
E se não quisermos estar sempre online?
Neste carnaval, eu desci com alguns amigos para a praia e baixamos alguns jogos para matar as saudades de uma jogatina em LAN. Meu primeiro choque foi ver que eram pouquíssimos games atuais que ainda ofereciam suporte à conexão local. Nem Age of Empires 2 HD, remasterização de um clássico, nos permitiu reviver essa experiência.
E assim pude passar por vários outros exemplos: Starcraft II, Diablo III, Quake Live, Battlefield 4. Franquias que deixaram de lado a jogatina local com o passar dos anos. Jogamos Counter-Strike: Global Offensive na pura “gambiarra”, mas em nenhum local da interface você encontra a opção que antigamente era a principal quando você sentava na lan house.
DotA 2 e League of Legends também dependem completamente de uma conexão com a internet. O MOBA da Valve deixa passar uma partidinha contra “bots”, mas é algo inútil se outras pessoas querem jogar comigo. É estranho algo limitar dois games de sucesso dessa maneira, ainda mais quando o gênero nasceu em um jogo cultuado nas LAN partys.
As lan houses — e anteriormente os fliperamas — eram os centros de encontros entre os amigos que gostavam de games. Hoje você faz tudo pela internet e pode carregá-la até mesmo no bolso da calça. A viciante conexão com o resto do mundo nos colocou em uma situação preguiçosa.
Parece que, com isso, multiplayer virou sinônimo de online. Parece que ficou subentendido. Uma situação incômoda que se espalha além dos computadores.
Diablo III para os consoles me chamou a atenção por finalmente reunir os amigos no sofá para jogarem juntos. Me lembrou de quatro crianças tentando matar as outras no Bomberman. Me lembrou de FIFA ou Mortal Kombat com quatro controles. Me lembrou que há um mundo de interação multiplayer além da internet que aos poucos está sendo deixado de lado.
No entanto, as lan houses estão caindo e os fliperamas ficaram obsoletos. Continuar investindo na jogatina local parece ser um desperdício de esforços. E tenho que admitir que é quase isso: quantas vezes você vai realmente ficar desconectado para curtir um pouco de Counter-Strike hoje em dia?
Você confia que os seus 10 MB de conexão estarão lá pra sempre.
“Se quer jogar sem internet, procure um FPS com história”, já ouvi. O mundo ficou tão dividido assim entre propostas single player e multiplayer? Não é bem assim. Me diverti muito com Doom, Age of Empires ou Call of Duty das duas maneiras. Até em Need for Speed eu perdi algumas partidas online com o carro que eu detonava na história.
[center]A foto preferida para estrelar na parede da lan house[/align]
Single player e multiplayer eram dois elementos que se completavam. Assim como a jogatina local e pela internet.
No fim, talvez tudo não passe de um sentimento nostálgico de como antigamente os jogos valorizavam mais o encontro entre as pessoas. De como a internet era muito cara para ser um centro de diversões para nós. De como você se empolgava em reunir os amigos para jogar Serious Sam. Ou Worms. Ou milhares de mods customizados de Half-life e Warcraft 3.
Tenho que admitir que os video games evoluíram e se adaptaram à modernidade, mas eu ainda tenho aquela vontade de desligar a internet e voltar um pouco no tempo. Pelo menos lá, o Skype era a sala de estar.