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O Legado do Cavaleiro Branco[/align]
[center]Capítulo 3
Uma guerra, uma Dieta e Dois Reis[/align]
[font=Georgia]O voivoide Draculesti esperava um novo ataque turco que seria defendido pelos húngaros, não um ataque húngaro. Ainda mais com um Habsburgo no trono. O velho general Hunyadi foi aposentado, devido à avançada idade. Diferentemente de muitos que viviam pela guerra, o herói húngaro chegou aos 68 anos bastante saudável para a idade e seguiu para cuidar de seu segundo filho, Mátyás, e de suas propriedades, embora declarasse que seguiria de perto vigiando as fronteiras da qual ainda era responsável por defender. Em seu lugar lideraria o conde Anasztáz Zichy, um nobre croata que ascendeu em prestígio estando sempre do lado vencedor nas guerras civis húngaras.
Seu teste de fogo como general foi relativamente fácil, derrotar com 20mil homens um exército de 6mil. Entretanto, para demonstrar suas habilidades, o conde Zichy venceu de forma eficiente. Primeiro, atraiu os valáquios para fora do seu território simulando um desentendimento entre os comandantes. Então manteve-os em combate com a sua infantaria, enquanto a cavalaria cercava passando por detrás de uma colina. O general valáquio não viu o movimento até ser tarde demais, resultando em todos os homens terem sido mortos ou feito prisioneiros. A misericórdia foi demonstrada, pois o rei Ladislau queria conquistar a subserviência voluntária do povo vlach. De outra forma, recorreriam aos sarracenos na primeira oportunidade.[/font]
[center]Hussardos húngaros saindo em ataque surpresa para cercar o exército valáquio.[/align]

[font=Georgia]Faltava ao voivoide Draculesti compartilhar deste pensamento. Mesmo sem exército, fortificou sua capital esperando cansar os invasores até sua desistência. O exército húngaro não era afeito à longas esperas. Em julho de 1455, Târgoviște foi cercada. Menos de um mês depois do início do cerco, em uma manhã de sol ardente, um mensageiro real chegava ao local. Trazia com as maiores condolências possíveis ao general Zichy notícias da morte do rei Ladislau. Avisou também que os Habsburgos já haviam sido informados e uma comitiva com ordens de Viena estava a caminho. O cerco, pelo visto, não ia durar. Uma grata surpresa quando apareceu já pela noite um emissário do voivoide Hunyadi, oferecendo mantimentos até que o cerco terminasse, enquanto debateriam em Pest sobre o futuro do reino. A proposta surpreendente foi aceita sem pensar pelo general.
A Dieta ocorrera 2 meses depois, em setembro, com membros da alta e baixa nobreza, o alto clero e, claro, os representantes Habsburgos. Foi uma Dieta quase fúnebre, com pouca comida e pouca bebida. Uma música baixa e melódica servia som de fundo das maquinações e negociações que ocorriam ali. A festa foi aberta com os pesares e lisonjeios da corte para a família Habsburgo, bem como os falando dos supostos dotes do falecido rei, passando então para seu representente, o Barão de Liechteistein. A ideia dos Habsburgos para o reino da Hungria era de que a coroa fosse para o cabeça da família, o imperador Friedrich III, entrando então o reino em união pessoal com o ducado da Áustria. Apesar de atraente, pois os reis estrangeiros normalmente tinham pouco poder na Hungria, tal escolha contava com uma armadilha. Os planos do imperador estavam em centralizar cada vez mais os seus vários domínios, principalmente os que obtivera nos Países Baixos, em torno do seu trono em Viena. O destino sem dúvida seria o mesmo para a Hungria logo em seguida e não haveria como contestar o exército imperial em caso de a centralização ocorrer pela força.[/font]

[center]“Sendo de sapiência de todos que o rei da Hungria, Ladislau V von Habsburgo, faleceu à pouco mais de uma semana de uma súbita pneumonia. É também de sapiência de todos que passou deste mundo sem filhos, sem irmãos e sem pai para que pudesse lhe passar imediatamente a coroa. Sendo portanto de costume, que a coroa passe a seu parente homem mais próximo vivo, sendo este o magnânimo Imperador Frederico III, Rei dos Romanos, duque da Áustria e Tirol, duque da Holanda, Brabant e Flandres e duque de Luxemburgo, defensor da fé e das leis do glorioso Sacro-Império Romano, é de esperar que os nobres do magnânimo Reino da Hungria aceitem aquele cuja coroa o pertence por direito de sangue, abençoado por Deus e aclamado pelos homens.” [/align]
O barão falou pouco, breve e de forma melodiosa. Após seu discurso, alguns nobres proeminentes pró-Áustria discursaram também a favor da legalidade e de como a União com a Áustria seria o melhor para Hungria, notadamente aqueles que se beneficiariam de vender diretamente para o arquiducado sem pagar os impostos de fronteira. Entretanto, dada a leniência dos Habsburgos em relação ao suporte na guerra contra a Valáquia, os nobres do oriente do reino estavam nervosos se eles despenderiam dos cofres imperiais em seu auxílio em caso de ataque otomano. O mais interessado e compromissado dentre eles era o Voivoide Hunyadi. Levantada esta questão por alguns nobres menores, discursou com uma voz já rouca pela idade, pausando algumas vezes vezes para recuperar o ar, mas que em nenhum momento fora interrompido.
[center]“Eu acho que não preciso me apresentar. Meu nome e meus feitos são conhecidos por cada um de vocês, inclusive entre os Habsburgos, eu suponho. Por muitos anos venho detendo o avanço otomano, destruindo seus exércitos, impedindo saques, matando os seus espiões e mantendo, constantemente, a vigilância nas nossas fronteiras ao sul. Inclusive, tenho feito muito mais que as obrigações que nossas leis me demandam. Aproveito este momento para que se faça cumprir a lei. A lei do nosso reino. Em primeiro lugar, nossas leis não dão o direito de sangue à coroa além dos filhos e irmãos e o falecido rei não os tinha nenhum. Sendo então, cabe a nós, os mais abençoados por Deus, membros desta Dieta, decidir aquele que carregará o fardo da coroa. Em segundo lugar, mantenho a dois meses o exército real às minhas próprias custas, como acordado com o general Zichy para manter o cerco a Târgoviște para manter a honra do falecido rei. Qualquer que assuma a coroa, assumirá também esta, como também a dívida com os próprios homens, que desde que Deus chamou seu rei para junto de si não recebem seu pagamento, como manda a lei.”[/align]
[font=Georgia]Os olhares pairaram sobre o conde Zichy. Segundo o costume, ele tinha esta liberdade de assumir uma dívida em nome do rei, mas não havia rei no momento. Naquele momento ele era, e ainda é, o capitão-geral do reino, e criar uma dívida para o próximo rei é, no mínimo, inaconselhável. Neste momento ele percebia que a generosidade de Hunyadi era uma armadilha. Mesmo general, na política fora apenas um peão. A Dieta ainda durou por mais dois meses. Os Habsburgos estavam com os cofres baixos, pois as províncias dos Países Baixos pouco lhe davam apoio e muito custo e ,com o passar do tempo, a dívida apenas aumentava. Decidiram então que não aceitariam uma dívida que não fizeram, tentando conseguir com que esta Dieta revogasse a dívida real, sem sucesso. Hunyadi então, mais uma vez, discursou afirmando a necessidade de um húngaro como rei da Hungria e, contando com o apoio tanto dos seus partidários quanto dos que ainda não tinham descoberto o plano por trás do ato de generosidade, conseguiu a maioria.
Esperava-se então que o próprio Hunyadi se candidatasse ao trono, mas candidatou seu filho em seu lugar, alegando que já estava velho para um fardo tão grande e que seu filho, mais instruído em outros aspectos que não a guerra que ele, seria um rei melhor para todos. A Hungria, segundo ele, precisava de mais que um general, mas não menos que isso. Apesar da contestação de que era mais educado na Alemanha que na Hungria, os barões viram isto como sinal de fraqueza e que poderiam conseguir mais e mais privilégios às custas do novo rei, principalmente após a morte de seu velho pai. A Dieta decidiu então eleger, em novembro de 1455, Mátyás Hunyadi, de apenas 12 anos, como rei da Hungria.[/font]