CAPÍTULO VII: Primeiro Contato
Após meses, a nave Korolev havia explorado o sistema Urrom. Nenhuma outra ação senciente foi localizada no sistema, tampouco outra relevância econômica. Entretanto, um achado biológico foi encontrado no mundo congelado de Urrom IV. Enquanto os sensores de longo alcance escaneavam a composição atmosférica, uma leitura incomum foi captada. Nuvens pareciam se deslocar de forma aleatória, contra as correntes atmosféricas, em várias regiões do planeta.
Uma análise observou e identificou que as nuvens sequer pareciam ser compostas de gases. Eram “aglomerados” biológicos aerosuspensos, mas ainda assim possuíam algum grau de articulação, que lhes permitia mobilidade e resistência contra as correntes atmosféricas. Os relatórios feitos pelas equipes de xenobotânica e xenozoologia pareciam inconclusivos, e o capitão-comandante Qiang He não se convenceu se essas espécies que projetavam grandes sombras “dançantes” sobre a superfície inóspita de Urrom IV pertenciam à flora ou a fauna. As classificações terrestres haviam sido invalidadas como padrão naqueles anos de exploração, e agora serviam apenas como comparativos.
Com o fim da Missão Urrom, o Diretório-Geral tinha duas opções para a Korolev: a primeira era continuar no aglomerado estelar local, investigando estrelas anãs vermelhas classe M, ou se afastar. A prioridade escolhida foi o completo mapeamento local, pois, embora a teoria astrofísica advogasse a baixa probabilidade de vida em estrelas anãs vermelhas, o Sistema Trappist renovou as expectativas sobre a vida no Cosmos.
Sob esta ótica, a nave Tereshkova iniciara a inspeção do Sistema Mauthula, batizado em homenagem ao astrônomo sul-africano Jahi Mauthula, que a descobriu em fins do século XXI e registro anterior de JM M3V3520498. Um sistema composto por dois mundo telúricos não habitáveis e um gigante gasoso orbitando uma anã vermelha. De igual modo, a Korolev foi designada para novas investigações no aglomerado local.
Em junho de 2205, a nave Korolev entrou no campo gravitacional da anã vermelha HM M2V87861487, nomeada de Manthall, em razão de Harris Manthall, astrônomo inglês que mapeou a estrela no início do século XXII. Mas pouco depois que o capitão-comandante Qiang He terminasse de conferir os dados astrofísicos básicos e inserisse informações cosmocartográficas no sistema computadorizado, os sensores de longo alcance também concluíram o processamento de suas leituras. Um dos oficiais na ponte observou os padrões dos sensores surgindo em seu monitor, e checou duas vezes antes de informar o comandante.
Os dados captados pareciam ser improváveis, e Qiang He pediu duas leituras complementares… O sistema Manthall era composto por três mundo telúricos e dois deles eram habitáveis… Dois mundo habitáveis em três planetas! A nave marcou o curso para Manthall II, o maior dos planetas, enquanto transmitia os dados para a Terra.
Tais dados sobre as estrelas vermelhas com planetas em órbitas próximas começavam a representar uma possibilidade estatística muito remota. Trappist, por exemplo, era uma estrela anã vermelha com meio bilhão de anos. Teorizou-se que sua estabilização heliofísica coincidiu com a destruição de um gigante gasoso, cujas luas se tonaram os atuais mundos telúricos encontrados, ou com a captura de corpos celestes “desgarrados”. As duas teorias eram tênues, mas eram as únicas explicações possíveis para a habitabilidade.
Agora a estrela Manthall adicionava um elemento perturbador. Diferente de Trappist, Manthall era uma estrela muito mais velha e com dois planetas de geofísica semelhante e biosfera ativa. Por mais que o acaso pudesse ser responsável por tais planetas, era altamente improvável que tantos fatores coincidissem para o sucesso da vida de forma natural. Assim, mesmo as teorias de Trappist poderiam estar completamente equivocadas e algum tipo de mecanismo de terraformação pudesse ter sido colocado em prática há milhões de anos.
Enquanto os debates prosseguiriam nos circuitos científicos, a nave colonial Revolução Russa alcançou a órbita de Trappist V. Com milhares de colonos, as naves iniciou os procedimentos para pouso no planeta. A riqueza agrícola do planeta motivou seu novo nome de batismo, vitorioso após votação em escala global: Prithvi, a divindade hindu que representava a personificação da Terra e da fertilidade do solo.
Desembarque de um dos transportes com equipe de varredura no futuro local de pouso da gigantesca nave Revolução Russa em Prithvi.
O clima de celebração em torno do sucesso do Programa de Colonização de Novos Mundos parecia dirimir as dúvidas existentes dentro do Diretório-Geral. O apoio da população global crescera exponencialmente. Sob o slogan “Encontre seu novo lar entre as estrelas do Cosmos”, o número de inscritos crescia continuamente, junto com os incentivos estatais para o crescimento dos núcleos familiares. Desde o século XX, nenhuma política de incentivo à natalidade havia alcançado tal patamar.
No sistema Manthall, a Korolev prosseguia em velocidade subluminal para a entrada na órbita de Manthall II. Pouco mais de duas unidades astronômicas de distância, novas leituras foram captadas da superfície do planeta. As leituras não coincidiam com qualquer leitura dos mundos habitáveis previamente inspecionados. Os sensores captaram sinais de isótopos de Estrôncio-90 e Césio-137 na alta atmosfera do planeta.
Quando o capitão-comandante Qiang He checou as leituras pela terceira vez, colocou toda a tripulação em alerta… Havia algo muito estranho em Manthall II, uma vez que tais elementos químicos não apareciam de forma “natural”. Eram produtos de alguma forma de fissão nuclear! Conforme a nave se aproximava do planeta, leituras eletromagnéticas indicavam padrões inteligentes de comunicação bem como a presença de estruturas artificiais em diferentes pontos do planeta. Indicativos que apenas confirmavam a necessidade de alerta total.
Já na órbita de Manthall II, a tripulação observou atônita a superfície do planeta… Estavam testemunhando uma inteligência extraterrestre altamente desenvolvida.
Drones foram enviados à superfície em modo furtivo em direção a regiões consideradas habitadas. Pelas análises, a espécie dominante no planeta era de morfologia bípede semelhante a classe de mamíferos, membros superiores com capacidade preênsil, tamanho médio 2,5 metros, desenvolvimento vocal e inteligência complexa. Os drones mapearam grandes aglomerações urbanas, principalmente em regiões temperadas e lacustres. Formas telemáticas de comunicação eram abundantes. Através de decifração, descobriu-se que aquela inteligência se auto-denominava Ekwyniana.
Os assentamentos urbanos ekwynianos pareciam ser distintos um dos outros, seja por estilo arquitetônico ou cultural. O mais emblemático é que os ekwynianos estavam preparados para alguma forma de conflito, com estruturas defensivas e meios sofisticados de combate. Em algumas regiões menos urbanizadas, as leituras indicavam instalações geotérmicas subterrâneas, localizadas apenas pelos seus exaustores. Porém, a energia nuclear parecia ser a matriz energética primária nos assentamentos mais desenvolvidos.
A espécie ekwyniana era populosa, na ordem de 26 bilhões de indivíduos. Possuía tendências sedentárias e era socialmente conflituosa. Haviam desenvolvido propensão ao raciocínio lógico-matemático, o que favorecia soluções surpreendentes de engenharia e na economia. Haviam desenvolvido ainda uma consciência conservacionista em relação aos recursos planetários.
Um dos maiores aglomerados urbanos ekwynianos em uma região lacustre boreal de Manthall II. A presença de estruturas assemelhadas a grandes “predadores” era recorrente.
A proliferação do poderio atômico parecia ter levado sua sociedade a um certo impasse bélico. A decifração linguística indicava motivações espiritualistas em suas hostilidades. Seja como fosse, os ekwynianos estavam em um estágio civilizacional delicado, no qual um simples estopim poderia levar a uma hecatombe nuclear.
A ameaça do potencial nuclear ekwyniano pouco intimidou a tripulação da Korolev, e três equipes de solo foram despachadas para regiões consideradas desabitadas do planeta a fim de catalogarem fauna e flora. O planeta em si possuía uma biodiversidade em todas as suas zonas, porém havia maior concentração em torno de mares pequenos e superfícies alagadiças. Nas regiões polares haviam florestas que prosperavam junto a grandes montanhas.
Manthall II foi classificado como um “mundo savana”, em vista de sua similaridade com os biomas africanos e sul-americanos. Grandes bandos de espécimes foram catalogados e classificados.
No radar de um dos transportes, o oficial de navegação alertou a ponte sobre a aproximação de um objeto em alta velocidade em rota paralela ao local de pouso, entre cânions secos. O comandante da inspeção ordenou a evacuação de sua equipe, mesmo com apenas algumas horas de permanência, pois não se pretendia nenhuma “contaminação cultural” ou deflagração hostil dos primitivos. Seja qual fosse a intenção do objeto, a aproximação furtiva representava um risco em potencial.
Os radares combinados do transporte e da Korolev indicavam o que parecia ser um tipo de “caça de combate” altamente manobrável.
Talvez a permanência em solo teria passado despercebida, talvez não. Mas o rastro de combustão dos motores primários do transporte chamou a atenção do artefato ekwyniano. Por precaução, o comandante acionou os escudos defletores ainda na atmosfera, o que fez o transporte emitir a radiação azulada de alta intensidade, atraindo a atenção alienígena, e desviando-na de seu curso original. Não fosse a potência dos motores do transporte humano, uma perseguição teria tido início.
Após alguns dias depois, as outras duas equipes voltariam à Korolev, sem nenhuma interferência. Todos os relatórios foram analisados pelo capitão-comandante Qiang He, que chegou a conclusão de que o encontro com o caça ekwyniano foi uma perigosa coincidência. Perigosa para a tripulação, pois não se sabia se o armamento primitivo poderia utilizar material nuclear, e também pela possibilidade de ser interpretada como uma ação hostil entre diferentes governos primitivos. A 27 de julho de 2205, a Korolev deixou a órbita de Manthall II.
Quando as informações foram transmitidas para a Terra, o capitão-comandante Qiang He havia utilizado um código criptografado concebido como “Protocolo de Primeiro Contato”. Somente o Diretor-Geral Igor Zhivenkov tinha a chave de desencriptação, e, após tomar ciência dos fatos, convocou uma reunião extraordinária com todos os membros do Diretório-Geral, a fim de elaborar a divulgação pública do primeiro contato com uma inteligência extraterrestre ativa.
O anúncio público acerca do “Primeiro Contato” seria feito em audiência extraordinária no Grande Congresso Socialista, onde o Diretor-Geral Igor Zhivenkov ressaltou a importância ímpar da descoberta, em setembro de 2205.
Na Terra, os noticiários foram interrompidos. O anúncio extraordinário foi feito ao longo de meia hora de um discurso entusiástico, mas, em certa medida, cometido. De um lado, xenólogos destacavam a oportunidade única de estudar uma inteligência ativa, com um desenvolvimento tecnológico semelhante ao século XX, e culturalmente ímpar. Prospectos da cultura ekwyniana seriam enviados para a Terra, para análise e estudo.
Por outro lado, a esfera militar expressou preocupação quanto à capacidade bélica nuclear dos ekwynianos. A opinião pública havia sido devidamente preparada após anos de descobertas de vestígios xenológicos. Mas encontrar um planeta inteiramente habitado por uma inteligência alienígena sofisticada e tão “próximo” da Terra era algo totalmente diferente. Visões positivas e pessimistas se contrastavam. A humanidade sempre encontrou dificuldades em aceitar as diferenças, e, não fosse a causa socialista, talvez a extinção já houvesse ocorrido. Ironicamente, a própria comunidade científica estava igualmente dividida.
A descoberta de vida inteligente Manthall II mudava o curso da História Humana. Agora, definitivamente, não estávamos mais sós no Cosmos. À altura dos fatos, determinar o rumo dos acontecimentos após o Primeiro Contato era incerto…
O RNG desse jogo foi bem “apelativo”, vamos assim dizer… Eu já ficaria muito feliz em encontrar um planeta primitivo, mas encontrar um continental junto… Agora, terei um dilema: iluminar os primitivos e perder a chance de colonizar o mundo continental por uns 15 anos ou dar uma de Mumm-Ra e eliminar os aliens thundercats 